Foi política a decisão de não esperar os habituais cinco anos para iniciar o processo, apoiar-se num “milagre” arrancado a fórceps e ignorar as objeções, em especial as fundadas nas obscuras manobras financeiras do Vaticano em sua gestão e a negativa do papa polonês a investigar e punir padres e bispos pedófilos. Principalmente o corrupto padre mexicano Marcial Maciel, líder da Legião de Cristo, que abusou de menores (inclusive dois de seus próprios filhos ilegítimos), mas manteve a boa vontade da Igreja arrecadando rios de dinheiro de milionários mexicanos, boa parte dos quais fluiu para os bolsos da Cúria Romana. O papa polonês protegeu-o até o fim e o próprio Ratzinger teve de esperar subir ao trono papal para discipliná-lo.
DiVersiFicando
Este é um blog pessoal que pretende provocar reflexão para a construção de uma sociedade mais justa e fraterna.
sexta-feira, 6 de maio de 2011
Ratzinger e a teologia do espetáculo
Foi política a decisão de não esperar os habituais cinco anos para iniciar o processo, apoiar-se num “milagre” arrancado a fórceps e ignorar as objeções, em especial as fundadas nas obscuras manobras financeiras do Vaticano em sua gestão e a negativa do papa polonês a investigar e punir padres e bispos pedófilos. Principalmente o corrupto padre mexicano Marcial Maciel, líder da Legião de Cristo, que abusou de menores (inclusive dois de seus próprios filhos ilegítimos), mas manteve a boa vontade da Igreja arrecadando rios de dinheiro de milionários mexicanos, boa parte dos quais fluiu para os bolsos da Cúria Romana. O papa polonês protegeu-o até o fim e o próprio Ratzinger teve de esperar subir ao trono papal para discipliná-lo.
sexta-feira, 18 de fevereiro de 2011
A fortuna corrupta do Mubarak
Não há tempo a perder, os governos precisam congelar as contas do Mubarak antes que o dinheiro desapareça em um labirinto de contas bancárias obscuras -- como as fortunas roubadas por muitos outros ditadores. A Suíça já congelou suas finanças e alguns ministros da União Europeia ofereceram ajuda -- mas sem um chamado global imediato, a reação poderá ser lenta demais para impedir que os bilhões do Mubarak sumam completamente.
Vamos convocar os líderes de todas as nações a garantir que o dinheiro do Egito seja devolvido ao povo. Se conseguirmos 500.000 assinaturas, a nossa petição será entregue aos ministros das finanças do G20 na reunião desta sexta-feira em Paris. Vamos assinar nossos nomes agora e divulgar a campanha!
http://www.avaaz.org/po/
Milhões de egípcios vivem com menos de $2 por dia e os peritos dizem que a corrupção no Egito custa mais de $6 milhões em dinheiro público todo ano. A família Mubarak se beneficiou enormemente por uma rede de contratos de negócios, esquemas de privatização e investimentos garantidos pelo governo, ao longo dos 30 anos da presidência do Mubarak. Estimativas da sua riqueza vão de "meros" $2-3 bilhões até $70 bilhões, o que faria Hosni Mubarak o homem mais rico do mundo. 25 oficiais sênior do governo já estão sob investigação por alavancar fortunas enquanto trabalhavam para o Mubarak.
Talvez este seja o fim da linha para governantes corruptos que escapam com fortunas intactas. A nova Convenção Contra a Corrupção da Nações Unidas, explicitamente pede que fundos adquiridos pela corrupção sejam devolvidos aos países de origem, e o governo militar do Egito já pediu para governos da União Europeia congelarem a fortuna do Mubarak. A pergunta chave no momento é se a reação será rápida o suficiente: nenhuma lei no mundo será capaz de ajudar se os bilhões do Mubarak forem espalhados e escondidos antes que as autoridades possam se apropriar deles.
As nossas vozes como cidadãos pode ajudar o povo do Egito a continuar tendo esperança na sua revolução. Participe do chamado para devolver as riquezas do Egito ao seu povo.
http://www.avaaz.org/po/
Milhões de egípcios arriscaram -- e até mesmo deram -- suas vidas pela democracia. Havia pouca coisa que pudéssemos fazer ao redor do mundo, além de enviar nossa esperança e solidariedade. Mas agora, nós devemos fazer o possível para restaurar a propriedade nacional roubada por uma ditadura que os nossos próprios governos toleraram por tanto tempo.
O povo do Egito está agora preparado para construir uma nova nação. Vamos garantir que eles recuperem os fundos que foram roubados, enquanto eles constroem um futuro que poucos ousaram sonhar.
Com esperança,
Ben, Alex, Ricken, Mia, Rewan, David e toda a equipe Avaaz
FONTES
Fortuna de Mubarak avaliada em 70 mil milhões de dólares:
http://aeiou.expresso.pt/
Egito pede congelamento de bens de ex-dirigentes:
http://www.estadao.com.br/
Mubarak desviou riqueza nos últimos dias no poder, diz jornal:
http://ultimosegundo.ig.com.
Londres investiga Mubarak mas não congela contas:
http://www.dn.pt/inicio/globo/
Em 30 anos, ditador obteve fortuna de US$ 70 bilhões:
http://odia.terra.com.br/

Apoie a comunidade da Avaaz! Nós somos totalmente sustentados por doações de indivíduos, não aceitamos financiamento de governos ou empresas. Nossa equipe dedicada garante que até as menores doações sejam bem aproveitadas -- clique para doar.
segunda-feira, 22 de novembro de 2010
A igreja e a homossexualidade: repensando
Tradicionalmente, a Igreja, com base em alguns textos bíblicos e em sua tradição, tem tratado esta questão como pecado e seus praticantes como os piores dos pecadores.
Entretanto, este problema está longe de ser uma questão do "mundo lá de fora", pois dentro da igreja existem inúmeros crentes que convivem com esta pulsão e não poucos de seus líderes tem-se revelado homossexuais.
Embora a igreja costume empurrar o problema para debaixo do tapete, favorecendo assim a hipocrisia e a mentira, e até pelo acúmulo da "sujeira" de todos estes anos, a questão está vazando por todos os lados e é inevitável, imprescindível e urgentemente necessária uma discussão ampla sobre o tema.
Para tanto, não basta somente abrir a Bíblia nos velhos e conhecidos textos. Precisamos ouvir a voz das ciências que estudam o comportamento humano e outras que possam contribuir para o enriquecimento e entendimento da questão.
Mais do que tudo, é mister ouvir os próprios membros de nossas igrejas que convivem com tais conflitos e sofrem preconceitos e dores tão insurportáveis que, não encontrando outra maneira de lidarem com suas pulsões, decidem por fim à própria vida. Tenho-me perguntado se Deus deseja isso, realmente.
Testemunhando o sofrimento de várias pessoas que vivem esta tensão e sofrem enormemente em razão de nossa posição, tenho orado, lido e ouvido à respeito e, creio, está na hora de colocar este tema na pauta de nossas discussões.
Abaixo, um vídeo para provocar nossa reflexão:
terça-feira, 26 de outubro de 2010
Carta de Theotonio dos Santos a FHC (Fernando Henrique Cardoso)
Meu caro Fernando,
Vejo-me na obrigação de responder a carta aberta que você dirigiu ao Lula, em nome de uma velha polêmica que você e o José Serra iniciaram em 1978 contra o Rui Mauro Marini, eu, André Gunder Frank e Vânia Bambirra, rompendo com um esforço teórico comum que iniciamos no Chile na segunda metade dos nos 1960. A discussão agora não é entre os cientistas sociais e sim a partir de uma experiência política que reflete comtudo este debate teórico. Esta carta assinada por você como ex-presidente é uma defesa muito frágil teórica e politicamente de sua gestão. Quem a lê não pode compreender porque você saiu do governo com 23% de aprovação enquanto Lula deixa o seu governo com 96% de aprovação. Já discutimos em várias oportunidades os mitos que se criaram em torno dos chamados êxitos do seu governo. Já no seu governo vários estudiosos discutimos, já no começo do seu governo, o inevitável caminho de seu fracasso junto à maioria da população. Pois as premissas teóricas em que baseava sua ação política eram profundamente equivocadas e contraditórias com os interesses da maioria da população. (Se os leitores têm interesse de conhecer o debate sobre estas bases teóricas lhe recomendo meu livro já esgotado: Teoria da Dependencia: Balanço e Perspectivas, Editora Civilização Brasileira, Rio, 2000).
O primeiro mito é de que seu governo foi um êxito econômico a partir do fortalecimento do real e que o governo Lula estaria apoiado neste êxito alcançando assim resultados positivos que não quer compartilhar com você... Em primeiro lugar vamos desmitificar a afirmação de que foi o plano real que acabou com a inflação. Os dados mostram que até 1993 a economia mundial vivia uma hiperinflação na qual todas as economias apresentavam inflações superiores a 10%. A partir de 1994, TODAS AS ECONOMIAS DO MUNDO APRESENTARAM UMA QUEDA DA INFLAÇÃO PARA MENOS DE 10%. Claro que em cada pais apareceram os “gênios” locais que se apresentaram como os autores desta queda. Mas isto é falso: tratava-se de um movimento planetário.
No caso brasileiro, a nossa inflação girou, durante todo seu governo, próxima dos 10% mais altos. TIVEMOS NO SEU GOVERNO UMA DAS MAIS ALTAS INFLAÇÕES DO MUNDO. E aqui chegamos no outro mito incrível. Segundo você e seus seguidores (e até setores de oposição ao seu governo que acreditam neste mito) sua política econômica assegurou a transformação do real numa moeda forte. Ora Fernando, sejamos cordatos: chamar uma moeda que começou em 1994 valendo 0,85 centavos por dólar e mantendo um valor falso até 1998, quando o próprio FMI exigia uma desvalorização de pelo menos uns 40% e o seu ministro da economia recusou-se a realizá-la “pelo menos até as eleições”, indicando assim a época em que esta desvalorização viria e quando os capitais estrangeiros deveriam sair do país antes de sua desvalorização, O fato é que quando você flexibilizou o cambio o real se desvalorizou chegando até a 4,00 reais por dólar. E não venha por a culpa da “ameaça petista” pois esta desvalorização ocorreu muito antes da “ameaça Lula”. ORA, UMA MOEDA QUE SE DESVALORIZA 4 VEZES EM 8 ANOS PODE SER CONSIDERADA UMA MOEDA FORTE? Em que manual de economia? Que economista respeitável sustenta esta tese?
Conclusões: O plano Real não derrubou a inflação e sim uma deflação mundial que fez cair as inflações no mundo inteiro. A inflação brasileira continuou sendo uma das maiores do mundo durante o seu governo. O real foi uma moeda drasticamente debilitada. Isto é evidente: quando nossa inflação esteve acima da inflação mundial por vários anos, nossa moeda tinha que ser altamente desvalorizada. De maneira suicida ela foi mantida artificialmente com um alto valor que levou à crise brutal de 1999.
Segundo mito; Segundo você, o seu governo foi um exemplo de rigor fiscal. Meu Deus: um governo que elevou a dívida pública do Brasil de uns 60 bilhões de reais em 1994 para mais de 850 bilhões de dólares quando entregou o governo ao Lula, oito anos depois, é um exemplo de rigor fiscal? Gostaria de saber que economista poderia sustentar esta tese. Isto é um dos casos mais sérios de irresponsabilidade fiscal em toda a história da humanidade.
E não adianta atribuir este endividamento colossal aos chamados “esqueletos” das dívidas dos estados, como o fez seu ministro de economia burlando a boa fé daqueles que preferiam não enfrentar a triste realidade de seu governo. Um governo que chegou a pagar 50% ao ano de juros por seus títulos para, em seguida, depositar os investimentos vindos do exterior em moeda forte a juros nominais de 3 a 4%, não pode fugir do fato de que criou uma dívida colossal só para atrair capitais do exterior para cobrir os déficits comerciais colossais gerados por uma moeda sobrevalorizada que impedia a exportação, agravada ainda mais pelos juros absurdos que pagava para cobrir o déficit que gerava.
Este nível de irresponsabilidade cambial se transforma em irresponsabilidade fiscal que o povo brasileiro pagou sob a forma de uma queda da renda de cada brasileiro pobre. Nem falar da brutal concentração de renda que esta política agravou dráticamente neste pais da maior concentração de renda no mundo. Vergonha, Fernando. Muita vergonha. Baixa a cabeça e entenda porque nem seus companheiros de partido querem se identificar com o seu governo...te obrigando a sair sozinho nesta tarefa insana.
Terceiro mito - Segundo você, o Brasil tinha dificuldade de pagar sua dívida externa por causa da ameaça de um caos econômico que se esperava do governo Lula. Fernando, não brinca com a compreensão das pessoas. Em 1999 o Brasil tinha chegado à drástica situação de ter perdido TODAS AS SUAS DIVISAS. Você teve que pedir ajuda ao seu amigo Clinton que colocou à sua disposição ns 20 bilhões de dólares do tesouro dos Estados Unidos e mais uns 25 BILHÕES DE DÓLARES DO FMI, Banco Mundial e BID. Tudo isto sem nenhuma garantia.
Esperava-se aumentar as exportações do pais para gerar divisas para pagar esta dívida. O fracasso do setor exportador brasileiro mesmo com a espetacular desvalorização do real não permitiu juntar nenhum recurso em dólar para pagar a dívida. Não tem nada a ver com a ameaça de Lula. A ameaça de Lula existiu exatamente em conseqüência deste fracasso colossal de sua política macro-econômica. Sua política externa submissa aos interesses norte-americanos, apesar de algumas declarações críticas, ligava nossas exportações a uma economia decadente e um mercado já copado. A recusa dos seus neoliberais de promover uma política industrial na qual o Estado apoiava e orientava nossas exportações. A loucura do endividamento interno colossal. A impossibilidade de realizar inversões públicas apesar dos enormes recursos obtidos com a venda de uns 100 bilhões de dólares de empresas brasileiras. Os juros mais altos do mundo que inviabilizava e ainda inviabiliza a competitividade de qualquer empresa.
Enfim, UM FRACASSO ECONOMICO ROTUNDO que se traduzia nos mais altos índices de risco do mundo, mesmo tratando-se de avaliadoras amigas. Uma dívida sem dinheiro para pagar... Fernando, o Lula não era ameaça de caos. Você era o caos. E o povo brasileiro correu tranquilamente o risco de eleger um torneiro mecânico e um partido de agitadores, segundo a avaliação de vocês, do que continuar a aventura econômica que você e seu partido criou para este país.
Gostaria de destacar a qualidade do seu governo em algum campo mas não posso fazê-lo nem no campo cultural para o qual foi chamado o nosso querido Francisco Weffort (neste então secretário geral do PT) e não criou um só museu, uma só campanha significativa. Que vergonha foi a comemoração dos 500 anos da “descoberta do Brasil”. E no plano educacional onde você não criou uma só universidade e entou em choque com a maioria dos professores universitários sucateados em seus salários e em seu prestígio profissional. Não Fernando, não posso reconhecer nada que não pudesse ser feito por um medíocre presidente.
Lamento muito o destino do Serra. Se ele não ganhar esta eleição vai ficar sem mandato, mas esta é a política. Vocês vão ter que revisar profundamente esta tentativa de encerrar a Era Vargas com a qual se identifica tão fortemente nosso povo. E terão que pensar que o capitalismo dependente que São Paulo construiu não é o que o povo brasileiro quer. E por mais que vocês tenham alcançado o domínio da imprensa brasileira, devido suas alianças internacionais e nacionais, está claro que isto não poderia assegurar ao PSDB um governo querido pelo nosso povo. Vocês vão ficar na nossa história com um episódio de reação contra o vedadeiro progresso que Dilma nos promete aprofundar. Ela nos disse que a luta contra a desigualdade é o verdadeiro fundamento de uma política progressista. E dessa política vocês estão fora.
Apesar de tudo isto, me dá pena colocar em choque tão radical uma velha amizade. Apesar deste caminho tão equivocado, eu ainda gosto de vocês ( e tenho a melhor recordação de Ruth) mas quero vocês longe do poder no Brasil. Como a grande maioria do povo brasileiro. Poderemos bater um papo inocente em algum congresso internacional se é que vocês algum dia voltarão a freqüentar este mundo dos intelectuais afastados das lides do poder.
Com a melhor disposição possível mas com amor à verdade, me despeço
thdossantos@terra.com.br
http://theotoniodossantos.
(*) Theotonio Dos Santos é Professor Emérito da Universidade Federal Fluminense, Presidente da Cátedra da UNESCO e da Universidade das Nações Unidas sobre economia global e desenvolvimentos sustentável. Professor visitante nacional sênior da Universidade Federal do Rio de Janeiro.
domingo, 24 de outubro de 2010
Para você, que não votou na Dilma
Os programas sociais brasileiros são irrisórios se comparados aos de países da Europa ocidental.
O salto na pesquisa brasileira desde a eleição de Lula é bastante expressivo. Em 2003, os investimentos em ciência e tecnologia foram de 21,4 bilhões de reais; em 2008, já atingiam R$ 43,1 bilhões. Paralelamente, houve notável aumento da produtividade científica brasileira: as publicações em peer-review journals saltaram de 14.237 em 2003 para 30.415 em 2008. Subimos da 17ª posição no ranking da SCImago, em 2000, para a 14ª, em 2008. Passamos países com maior tradição de pesquisa, como a Suíça e a Rússia. A política de pesquisa do Governo Lula foi elogiada inclusive pela Nature, uma das revistas científicas mais importantes do mundo (aí, Tio Rei, coloque mais essa na lista do jornalismo chapa-branca). Eu não voto em José Serra porque não quero que a universidade e a pesquisa brasileiras sejam sucateadas novamente. Não merecemos outro Paulo Renato.
Salpétriêre, em Paris. É doutorando em neurociências na Université Paris VI. Este texto foi publicado inicialmente em seu blog: aterceiramargemdosena.
[ATUALIZAÇÃO: O texto foi modificado. Este blogueiro havia citado Eduardo Jorge como exemplo de corrupção no governo FHC. Eduardo Jorge foi, de fato, acusado de inúmeros crimes (inclusive pela própria Veja). Contudo, foi julgado e inocentado de todas as acusações. O trecho referente a Eduardo Jorge foi riscado. Peço desculpas aos leitores pela informação equivocada. E agradeço ao Zé Costa por ter me informado o erro]
terça-feira, 19 de outubro de 2010
Igrejas: o perigo empresarial - uma reflexão

Roseli Kiselar Aguilera
Psicóloga
segunda-feira, 18 de outubro de 2010
Dois pesos...
Este jornal teve uma atitude que considero digna: explicitou aos leitores que apoia o candidato Serra na presente eleição. Fica assim mais honesta a discussão que se faz em suas páginas. O debate eleitoral que nos conduzirá às urnas amanhã está acirrado. Eleitores se declaram exaustos e desiludidos com o vale-tudo que marcou a disputa pela Presidência da República. As campanhas, transformadas em espetáculo televisivo, não convencem mais ninguém. Apesar disso, alguma coisa importante está em jogo este ano. Parece até que temos luta de classes no Brasil: esta que muitos acreditam ter sido soterrada pelos últimos tijolos do Muro de Berlim. Na TV a briga é maquiada, mas na internet o jogo é duro. Se o povão das chamadas classes D e E - os que vivem nos grotões perdidos do interior do Brasil - tivesse acesso à internet, talvez se revoltasse contra as inúmeras correntes de mensagens que desqualificam seus votos. O argumento já é familiar ao leitor: os votos dos pobres a favor da continuidade das políticas sociais implantadas durante oito anos de governo Lula não valem tanto quanto os nossos. Não são expressão consciente de vontade política. Teriam sido comprados ao preço do que parte da oposição chama de bolsa-esmola. Uma dessas correntes chegou à minha caixa postal vinda de diversos destinatários. Reproduzia a denúncia feita por "uma prima" do autor, residente em Fortaleza. A denunciante, indignada com a indolência dos trabalhadores não qualificados de sua cidade, queixava-se de que ninguém mais queria ocupar a vaga de porteiro do prédio onde mora. Os candidatos naturais ao emprego preferiam viver na moleza, com o dinheiro da Bolsa-Família. Ora, essa. A que ponto chegamos. Não se fazem mais pés de chinelo como antigamente. Onde foram parar os verdadeiros humildes de quem o patronato cordial tanto gostava, capazes de trabalhar bem mais que as oito horas regulamentares por uma miséria? Sim, porque é curioso que ninguém tenha questionado o valor do salário oferecido pelo condomínio da capital cearense. A troca do emprego pela Bolsa-Família só seria vantajosa para os supostos espertalhões, preguiçosos e aproveitadores se o salário oferecido fosse inconstitucional: mais baixo do que metade do mínimo. R$ 200 é o valor máximo a que chega a soma de todos os benefícios do governo para quem tem mais de três filhos, com a condição de mantê-los na escola. Outra denúncia indignada que corre pela internet é a de que na cidade do interior do Piauí onde vivem os parentes da empregada de algum paulistano, todos os moradores vivem do dinheiro dos programas do governo. Se for verdade, é estarrecedor imaginar do que viviam antes disso. Passava-se fome, na certa, como no assustador Garapa, filme de José Padilha. Passava-se fome todos os dias. Continuam pobres as famílias abaixo da classe C que hoje recebem a bolsa, somada ao dinheirinho de alguma aposentadoria. Só que agora comem. Alguns já conseguem até produzir e vender para outros que também começaram a comprar o que comer. O economista Paul Singer informa que, nas cidades pequenas, essa pouca entrada de dinheiro tem um efeito surpreendente sobre a economia local. A Bolsa-Família, acreditem se quiserem, proporciona as condições de consumo capazes de gerar empregos. O voto da turma da "esmolinha" é político e revela consciência de classe recém-adquirida. O Brasil mudou nesse ponto. Mas ao contrário do que pensam os indignados da internet, mudou para melhor. Se até pouco tempo alguns empregadores costumavam contratar, por menos de um salário mínimo, pessoas sem alternativa de trabalho e sem consciência de seus direitos, hoje não é tão fácil encontrar quem aceite trabalhar nessas condições. Vale mais tentar a vida a partir da Bolsa-Família, que apesar de modesta, reduziu de 12% para 4,8% a faixa de população em estado de pobreza extrema. Será que o leitor paulistano tem ideia de quanto é preciso ser pobre, para sair dessa faixa por uma diferença de R$ 200? Quando o Estado começa a garantir alguns direitos mínimos à população, esta se politiza e passa a exigir que eles sejam cumpridos. Um amigo chamou esse efeito de "acumulação primitiva de democracia". Mas parece que o voto dessa gente ainda desperta o argumento de que os brasileiros, como na inesquecível observação de Pelé, não estão preparados para votar. Nem todos, é claro. Depois do segundo turno de 2006, o sociólogo Hélio Jaguaribe escreveu que os 60% de brasileiros que votaram em Lula teriam levado em conta apenas seus próprios interesses, enquanto os outros 40% de supostos eleitores instruídos pensavam nos interesses do País. Jaguaribe só não explicou como foi possível que o Brasil, dirigido pela elite instruída que se preocupava com os interesses de todos, tenha chegado ao terceiro milênio contando com 60% de sua população tão inculta a ponto de seu voto ser desqualificado como pouco republicano. Agora que os mais pobres conseguiram levantar a cabeça acima da linha da mendicância e da dependência das relações de favor que sempre caracterizaram as políticas locais pelo interior do País, dizem que votar em causa própria não vale. Quando, pela primeira vez, os sem-cidadania conquistaram direitos mínimos que desejam preservar pela via democrática, parte dos cidadãos que se consideram classe A vem a público desqualificar a seriedade de seus votos.
Maria Rita Kehl
Fonte: O Estado de São Paulo - 02 de outubro de 2010
OBS: A autora foi demitida do Estadão após a publicação desta matéria.